Mapa da violência revela que no Brasil somente 8% dos homicídios são esclarecidos
Correspondente Internacional, Zwela Angola - link - fonte
BRASILIA/BRASIL (ZWELA ANGOLA) - No Brasil, de cada 50 mil assassinatos ocorridos no País por ano, apenas 4 mil deles são esclarecidos, com o autor descoberto e preso, enquanto que, 96 mil a polícia não consegue apontar a autoria do crime, e o criminoso permanece impune.
A estimativa é de Julio Jacobo Waiselfisz, coordenador da pesquisa Mapas da Violência 2011, divulgada pelo Ministério da Justiça, em entrevista à imprensa.
São pelo menos cem mil assassinatos sem solução no Brasil até 2007, muitos deles já prescritos dentro do prazo de 20 anos previsto pelo Código Penal Brasileiro.
Entre os fatores que prejudicam o esclarecimento dos homicídios estão o sucateamento das delegacias de polícia; a falta de infraestrutura das polícias técnicas nos estados para obtenção de provas; a falta de investigadores; e a burocracia, além da não integração entre delegados, promotores e a Justiça no andamento dos inquéritos.
“O Brasil não tem uma estrutura de segurança pública formada. Não há um sistema nacional integrado para o tema. Há uma resistência grande em abrir a caixa-preta da criminalidade no país. Tem estado, como Alagoas, cujo índice de solução de homicídios não chega a 2%”, afirma Waiselfisz.
Para agilizar as investigações, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) criou, em parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Ministério da Justiça e os governos estaduais, a Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp), chamada de Meta 2, pata tentar concluir inquéritos abertos até dezembro de 2007.
Até o último dia 13, já eram 95.272 casos de crimes sem conclusão no país. Entretanto, a expectativa é de que o número passe dos cem mil, já que 16 estados vão apresentar relatórios com a estatística atualizada.
A missão de cumprir a Meta 2, porém, será difícil. O prazo dado às polícias para encerrar os casos nos estados com mais de quatro mil inquéritos em andamento terminaria em julho, mas já foi prorrogado para o fim de dezembro por causa da demanda.
“Os problemas não são de agora. A Enasp está jogando luz em cima do problema”, disse a juíza federal Taís Ferraz, coordenadora do Grupo de Persecução Penal do Enasp, que cita dificuldades encontradas nas investigações. “Há situação em que é preciso três pessoas assinarem um documento para realizar determinada diligência. E faltam equipamentos e peritos.”
No Rio de Janeiro, por exemplo, o Centro Integrado de Apuração Criminal (Ciac) possui 30 mil inquéritos da capital, sendo 15 mil de homicídios ocorridos até dezembro de 2007. Dos 15 mil procedimentos abertos, 60% estão prontos para serem arquivados. Ou seja: casos sem qualquer referência dos assassinos ou já investigados, mas com baixa possibilidade de se chegar ao autor. Outros 39% ainda dependem de investigações e apenas 1% tem a autoria identificada.
“Criamos o Programa de Resolução Operacional de Homicídios, com técnicas padronizadas para obter sucesso nas investigações. O conselho do Ministério Público recomendou a outros estados para que exista um padrão nas investigações”, diz o procurador de Justiça Rogério Scantamburlo, coordenador do Ciac.
Antônio Maciel Aguiar, presidente da Federação Nacional dos Profissionais de Papiloscopia e Identificação, destaca a falta de especialistas. “Em Goiás, por exemplo, temos só 150 papiloscopistas para atender a 246 municípios.”
Em 2010, o coordenador do Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana da UFRJ, Michel Misse, publicou “O inquérito policial no Brasil: Resultados gerais de uma pesquisa” e fez a seguinte análise: “Observaram-se em alguns estados (especialmente no Rio de Janeiro), alta rotatividade de delegados e policiais entre as delegacias e uma constante reclamação de interferência política na atividade policial”.
Cláudio Beato, coordenador do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da Universidade Federal de Minas Gerais, afirma: “Hoje, a polícia investiga com base em depoimentos de testemunhas. É um método atrasado, defasado. Só há peritos de corpos e não de cenas do crime. Nos Estados Unidos, a testemunha é a prova menos importante em um julgamento. No Brasil, a confissão é o objetivo. Se não há confissão, dificilmente chega-se ao autor.”
Segundo dados do Mapa da Violência 2011, no que se refere à impunidade dos crimes de homicídios no Brasil, que mata tem 92% de chances de ficar impune pelo crime cometido, pois dos 50 mil homicídios ocorridos anualmente no país, apenas 8% são solucionados. É o que se pode chamar de impunidade quase plena.
No estado de Alagoas, por exemplo, o quadro é ainda mais sombrio. No estado nordestino, apenas 2% dos assassinatos são solucionados. Enquanto isso, no Rio de Janeiro, 60% dos 15 mil inquéritos abertos até 2007 estão prontos para serem arquivados, 39% dependem de investigação e apenas 1% tem a autoria identificada.
Se comparado às polícias mais eficientes no mundo, como a do Japão, mais de 95% dos crimes de toda espécie são elucidados. No Brasil, com raras exceções, há pouquíssimos investimentos para melhorar efetivamente o trabalho da Polícia Judiciária no Brasil.
Apesar da existência da Secretaria Nacional de Segurança Pública, o Brasil não tem um plano integrado eficaz no campo da segurança pública, apesar de o recém criado Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) estar desenvolvendo alguns projetos sociais de sucesso em comunidades mais necessitadas.
O maior exemplo de deficiência e da falta de uma ação policial eficaz está no fato de que quase oito milhões de armas irregulares continuam circulando no país. Assim, quanto mais armas em circulação, maior a possibilidade de ocorrerem crimes de homicídio.
A facilidade para a aquisição de armas e gritante no Brasil. O psicopata causador da tragédia de Realengo, no Rio de Janeiro, por exemplo, adquiriu um revólver por R$ 260,00. Além disso, temos a vulnerabilidade de nossas fronteiras e inexistência de uma Guarda Nacional específica para tais locais.
A tudo isso, soma-se o fato que apenas identificar a autoria de crime no Brasil não é sinônimo de condenação e cumprimento da pena correspondente. Há os que se encontram foragidos e os que são protegidos pela benevolência da lei penal, sem falar na morosidade da Justiça.
Os poucos resultados no trabalho da polícia investigativa, com a notória falta de estrutura necessária, e a frouxidão da lei penal brasileira continuarão incentivando os crimes contra a vida no Brasil.
ANTONIO CARLOS LACERDA é jornalista e correspondente internacional da Imprensa Estrangeira no Brasil